Melhor do que sonho de doce de leite!

Difícil imaginar algum adulto que já não tenha tido o prazer de ter a companhia de um piá chato. Não como esses que algumas vezes nos vem vender balas ou cuidar do carro durante à noite. Refiro-me ao "chato", que não se satisfaz em ser incômodo mas tem o prazer em nos contardizer. João era o nome do fera e não tinha mais de nove anos de idade e uns trinta quilos de ossos revoltos por uma fina camada de pele. Ao sentar-me para ler ele vinha logo me perguntar sobre a revista e logo já queria ouvir música.

Ao tentar ouvir música, o tormento já dava sinais de vida, ora cantando mais altos do que as caixas acústicas ou enão trocando os discos, fitas ou então fazendo toda gama de "dedonages"na aparelhagem. Um simples olhar para ele já significava um convite a admoestações de toda a sorte.

No sentido lato da palavra guri, não víamos algo que o enquadrasse. Talvez o dicionário de zoologia encontrássemos uma definição sensata, ou talvez, nos livros de ocultismo, como por exemplo, o dito "encosto". Certa vez, ao ir comprar pão, tive um destes contra-gostos. Ao notar que para o café da tarde não tinha pão d'água, peguei uma sacola e algum trocado e pus-me a caminho da panificadora, a qul, não ficava a mais de algumas quadras dalí. Logo ouço uma espécie de grunhido do imberbe que dizia:

_ Posso ir?

Conhecedor da figura, dai dei chance a maiores escânda-los e abri mão da minha própria companhia, a melhor em certos momentos de nossas vidas. Como tinha pelo menos dois terços a mais em tamanho, não raro era os reclames por parte da figurinha. Ora por estar indo rápido demais ora por não lhe dar a devida atenção.

_ Quero sonho! Interpelou-me ao adentrar na panificadora do chinês.
_ Me dá também sonho. Disse à moça.
_ Creme ou nata?
_ Creme. Retruquei rápido.
_ Nata, eu quero nata. Disse o magrelo com cara de vira lata faminto.
_ Me dá um de nata para p "sará". Disse, como o apelidara.
Pago a conta e fomos comendo para casa, ou melhor, fui. O saracura embirrou de tal maneira que só me acompanhou a uns 50 metros atrás para não se perder. A cada quadra o ranheta gritava.
_ Eu queria sonho de doce de leite.
_ Doce de leite? Por que você não falou?
_ Me dá o seu? Agora eu quero doce de leite!
Assim foi por todo o resto do dia. Você pode pensar que isso me aborreceria ainda mais se engana, pois o prazer dele em me aporrinhar crescia assim como o meu prazer em vê-lo chorar a cada instante. Se não por maldades dessa natureza, é ora por piadas ora por escroques ou esquentões de orelha como me fazia um tio quando pequeno. Isso era uma delícia, melhor do que sonho de doce de leite.

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